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Dicionário autista

1 de abril de 2017 , In: Aprendendo com o autismo , With: No Comments
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O que é autismo? O que é neurodiversidade? Transtorno do Espectro Autista? Autistas têm níveis, graus?
Quando nos deparamos com um diagnóstico de autismo, um mundo de informações desconhecidas é despejado em nossas mãos, seja pelos profissionais que nos atendem, seja por textos e artigos na internet que amigos, ansiosamente, nos enviam.

É muita informação, acredite. Eu pesquisei muito, comprei diversos livros, li artigos, conversei com pessoas diferentes… aprendi muita coisa que, depois, descartei completamente. Meu objetivo aqui não é encerrar o assunto, mas trazer alguns desses termos que são utilizados com frequência, fazendo uma relação entre termos capacitistas e patologizantes com os que são mais usados por quem defende a neurodiversidade.

Autismo (modelo médico):
No Brasil, assim como em 114 outros países, se utiliza a CID – Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados com a Saúde – lançado pela Organização Mundial de Saúde (OMS). O autismo, na CID 10 (versão atual), é classificado no capítulo F.84 dos Transtornos Invasivos do Desenvolvimento, ao lado de outros como a Síndrome de Asperger. Para a CID, o autismo é um transtorno de neurodesenvolvimento.

Já os Estados Unidos utilizam o DSM (Manual de Diagnóstico e Estatística dos Transtornos Mentais) que, em sua última versão (V), lançou o termo “Transtorno do Espectro do Autismo” para designar tanto o autismo quanto a Síndrome de Asperger, que hoje, já se sabe, não é uma condição diversa da primeira como se imaginava. No DSM o autismo é classificado por níveis (1,2 e 3), de acordo com as características apresentadas, e pode ser chamado simplesmente de leve, moderado e severo.

Autismo na neurodiversidade:
Autismo é uma condição da neurodiversidade humana, uma forma diferente do cérebro processar as informações, principalmente as que estão relacionadas com o sistema sensorial (visão, tato, audição, paladar, olfato, sistema vestibular e proprioceptivo). Sua origem é genética e causa diferenças em três áreas: na comunicação social, na interação e em movimentos e comportamentos repetitivos/restritos.

Autistas possuem um cérebro cujo número de sinapses é muito maior do que uma pessoa não autista; uma deficiência nos fatores neurotróficos, responsáveis pelas podas neuronais e um processamento das informações sensoriais diferente do padrão esperado. Como cada autista é um indivíduo, esses diferenças variam de uma pessoa para a outra. Não existem pessoas mais ou menos autistas, existem indivíduos com suas particularidades.

Capacitismo e Psicofobia:

O capacitismo é o preconceito contra pessoas com deficiência. Em nosso sistema social e político, existe a ideia de que pessoas devam ser hierarquizadas de acordo com o funcionamento dos corpos, do modelo de beleza vigente, do gênero, da raça, da orientação sexual ou da classe social. No caso do capacitismo, o (pré)conceito dominante é que pessoas com deficiência são incapazes (de trabalhar, de estudar, de manterem relacionamentos amorosos) e, por isso, dependentes das pessoas ditas “capazes”. Elas valem “menos” do que as ditas “normais”, como se todas e todos nós não precisássemos de algum tipo de apoio em algum momento da vida. Como se o “sucesso” de alguém pudesse ser medido por essa necessidade de apoio. O capacitismo se expressa de diversas formas, de “piadas” até a negação absoluta dos direitos das pessoas com deficiência.

A psicofobia nada mais é que o capacitismo aplicado às diferenças neuronais. Pessoas neurodivergentes são consideradas incapazes ou pior, de caráter duvidoso. O tratamento dado a elas varia do paternalismo ao medo do contato.  É um dos preconceitos mais enraizados e naturalizados em nosso dia a dia. Quando queremos falar que alguém é mau caráter, ruim, usualmente utilizamos termos ligados aos neuerodiverentes. Por outro lado, algumas condições neurodivergentes são invisibilizadas e consideradas como uma escolha da pessoa, não como uma condição diversa, que demanda apoio e respeito.

Deficiência (modelo médico):

Para o modelo médico, a deficiência é uma insuficiência do ser humano, um erro da natureza, algo que deveria ser consertado, erradicado. É ser menos eficiente do que o indivíduo sem deficiência.

Deficiência para a neurodiversidade:

A deficiência é o resultado da interação do indivíduo com o ambiente que o cerca. De acordo com a Lei Brasileira de Inclusão (LBI) em seu artigo 2, “Considera-se pessoa com deficiência aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas.”

Atenção: Não se usam os termos “criança especial”, “portador de necessidades especiais”, “portador de autismo”, etc. Pela lei – definida de acordo com o resultado da Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas Com Deficiência – o termo correto é Criança com Deficiência ou Pessoa com Deficiência. Ainda existe um grande debate entre as pessoas com deficiência em relação ao deficiente x com deficiência e vem predominando, no Brasil,a preferência na utilização do termo pessoa autista e não pessoa com autismo, por isso, tente utilizar CRIANÇA AUTISTA E PESSOA AUTISTA.

Ecolalia:

É uma repetição da fala, podendo ser a última palavra dita ou até a frase inteira. De acordo com autistas, o uso da ecolalia auxilia no entendimento da comunicação falada e na organização do pensamento para uma resposta mais adequada.

Estereotipia (modelo médico):

Movimentos repetitivos realizados por autistas com a finalidade de se auto-estimularem sensorialmente. Os movimentos mais comuns são o balançar as mãos (flapping), pular, girar, alinhar objetos de acordo com um padrão determinado, usar de ecolalia na fala. Até pouco tempo atrás, a psiquiatria considerava esses movimentos inadequados e, por meio de terapias comportamentais, como a ABA, tentaram eliminá-los, mas as evidências científicas e o depoimento de diversos autistas vêm demonstrando que os movimentos – que não são controláveis pelo autista – são necessários para sua autorregulação e retirá-los causam prejuízos graves.

Stims* na Neurodiversidade:

Esqueça o termo estereotipia. Chamados de stims ou stimming pelos autistas estadunidenses, além de serem movimentos autorregulatórios, são também uma forma de expressão e comunicação. Pessoas não autistas também utilizam stims como tamborilar os dedos ou balançar as pernas em situação de excitação ou stress.

Neurodiversidade:

É um conceito que defende as diferenças neurológicas como sendo parte da diversidade humana e assim devem ser reconhecidas e respeitadas. Para nós, adeptos da neurodiversidade, o autismo é uma condição, não um transtorno ou uma doença a ser tratada. Não se trata o autismo, busca-se promover a derrubada das barreiras físicas e atitudinais existentes no ambiente, oferecendo as ferramentas necessárias para que as pessoas autistas possam usufruir de seus direitos e viverem como autistas que são, sem precisarem se “adequar” a um conceito único de padrão neuronal.

Síndrome de Asperger:

Pela CID 10 a síndrome é caracterizada por uma alteração qualitativa nas interações sociais, semelhante ao autismo. Para o DSM, como disse acima, o diagnóstico da Síndrome foi descartado.

Síndrome de Asperger é autismo na Neurodiversidade:
Hans Asperger, pesquisador e psiquiatra austríaco, foi o primeiro a descrever a “síndrome”, quase que ao mesmo tempo que Leo Kanner, seu colega de faculdade, radicado nos Estados Unidos, descreveu o autismo infantil. Ambos pesquisavam a mesma coisa, mas com olhares diferentes: Asperger fez pesquisas muito mais profundas, com grupos mais heterogeneos, além de estimular seus pacientes a desenvolver suas habilidades, enquanto Kanner era adepto da internação e medicalização, e só aceitava em sua pesquisa crianças autistas não falantes, do sexo masculino, ou seja, que estivessem dentro da caixinha que ele criou para a condição.

Portanto, Síndrome de Asperger é autismo. Não, autistas “aspies” não são gênios (alguns podem ser, outros não, assim como neurotípicos). Infelizmente, por conta do peso social da palavra autismo, alguns autistas e seus familiares ainda utilizam o termo “asperger” ou “aspie” (e claro, existem aqueles que ainda não aprenderam sobre a verdadeira história do autismo, mas aí já é outra história…)

Sistema Vestibular:

É o conjunto de órgãos do ouvido interno responsável pelo nosso equilíbrio.

Terapia de Integração Sensorial:

Cerca de 95% das crianças autistas (e cerca de 5% das não autistas) apresentam o transtorno do processamento sensorial. Existe uma grande variedade nas experiências sensoriais e no grau de intensidade dessas experiências, portanto o terapeuta ocupacional deve estar atento àquela criança e não em uma fórmula qualquer. A terapia de integração sensorial busca, por meio de brincadeiras exploratórias e interação social, auxiliar a organização cerebral para processar de forma mais eficiente as informações sensoriais e apresentar respostas apropriadas ao conjunto de estímulos.

Transtorno do Processamento Sensorial:

O cérebro de quem tem transtorno do processamento sensorial processa as informações sensoriais de uma forma diferente dos chamados “neurotípicos”. Não é comportamental, é neuronal. Existem crianças que não suportam barulhos ou atividades em que tenham que se sujar – são aquelas que evitam sensações por terem hiperssensibilidade sensorial) e as que buscam sensações sensoriais a maior parte do tempo, como por exemplo meu filho, que vive subindo em tudo, mastiga objetos, parece não ter olfato, etc.

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